A rendição de Stanley Conceição

fotografia do navio Alpha

A caminho da rendição
(imagem em domínio público)

Singapura........Paraíso de charme e elegância britânica, onde um chá e conversa de fim de tarde na esplanada de um hotel ou café era prática comum dos cidadãos europeus residentes. Nas movimentadas ruas de comércio, senhoras elegantemente vestidas visualizam montras de lojas  enquanto as crianças se encontram entretidas com um "sorvete" e os cavalheiros discutem as sua proezas no jogo de póker da anterior noite...uma verdadeira capital europeia fora da Europa.

Para além de tudo isto, Singapura era também o orgulho britânico da Ásia, uma verdadeira fortaleza impregnável, "recheada" de bunkers, trincheiras e peças de artilharia que fariam esta colónia capaz de resistir a qualquer ataque que eventualmente fosse lançado contra....ou assim se pensava.

Todas as movimentações militares japonesas de Dezembro 1941, indicavam que a guerra "estaria a caminho" e a 15 de Fevereiro de 1942, Singapura "caiu" mesmo nas mãos dos atacantes japoneses.

Com a captura deste "reduto" britânico, dezenas de milhares de soldados aliados foram enviados para campos de prisioneiros, ficando sujeitos a maus tratos, fome, doenças e todo o tipo de atrocidades. Entre os milhares de prisioneiros, estavam alguns portugueses e lusodescendentes.

fotografia do navio Alpha

Registo de prisioneiros onde consta o nome de Stanley.

Stanley Joseph Conceição, militar voluntário lusodescendente e integrado na unidade "Straits Settlements Volunteer Force", foi um dos capturados durante a queda de Singapura. Encontrando-se de guarda na pacata "Meyer Road", apenas ouvia explosões ao longe até que lhe fora transmitido que os japoneses haviam entrado em Singapura e que se deveria apresentar de imediato em "Scotts Road". 

Armado com uma espingarda Lee Enfiled e apenas dois "carregadores", apresentou-se mais tarde no novo posto. Nesta localidade e no centro de uma intensa correria, foi-lhe ordenado pelo seu sargento que mantivesse o seu novo posto até novas ordens.....Essas ordens vieram pouco depois, com informações da rendição britânica e que deveria novamente aguardar até novas indicações.

Sem saber o que fazer, Stanley, aguardou, passando-se diversas horas sem novidades por parte dos seus oficiais, até que um sargento que corria "rua acima", espantado, lhe gritou do lado oposto "que corresse porque os japoneses estavam na rua abaixo". A primeira interação com militares nipónicos veio momentos mais tarde, quando guardas coreanos (integrados nas forças japonesas) o prenderam e transportaram para junto de outros prisioneiros aliados, seguindo-se daí a primeira marcha que faria, em direção à prisão e campo de internamento de Changi.

Transportando todos os bens que possuía consigo, marchou num grupo de cerca de cem prisioneiros por ruas "apinhadas" de curiosos civis que se juntavam para os observarem, sob os olhares atentos da guarda japonesa.

Em Changi, Stanley, ficou inicialmente responsável pela criação e manutenção diária do sistema sanitário do campo, em especial, fossas e drenos mas também dos enterros de corpos de falecidos que se encontravam espalhados pelas praias de "Changi Point". Foi mais tarde transferido para diversos outros pequenos campos em redor de Singapura, até que ao fim de seis meses, foi informado por um oficial inglês que por ser considerado " saudável o suficiente", seria enviado para a Tailândia.

Desconhecendo ainda os perigos e acontecimentos futuros dos trabalhos na linha férrea de "Thai-Burma", Stanley, cheio de moral e juntamente com alguns camaradas da sua Companhia "D", seguiu por comboio, no interior de um vagão de carga.

fotografia do navio Alpha

Registo de libertação de Stanley Conceição

Num vagão de carga, com cerca de 30 a 40 pessoas no seu interior chegou à Tailândia, onde seria transferido de campo em campo para trabalhos de limpeza de mata e construção da linha férrea e teria de lutar diáriamente contra maus tratos, más condições sanitárias, doenças, insectos, cobras e escorpiões.

Com apenas duas rações diárias de arroz e chá, foi obrigado a construir pontes e a linha de comboio, durante cerca de três anos e meio.

Com o passar do tempo e dos anos, inúmeros rumores de uma rendição circulavam pelo campo e as sentinelas japonesas tornaram-se cada vez menos e mais "simpáticas".

Um dia, a chegada de uma viatura, transportando dois oficiais ingleses, confirmou todos esses rumores, "estão livres", disseram-lhes.

Stanley foi libertado a 2 de Julho de 1945.

 

António Fragoeiro




 

Fontes/ Sources:

  • Arquivos: National Archives UK, Kew (GB); Arquivo Histórico da Marinha (PT); Arquivo Histórico do MNE (PT); 
  • Sites: uboat.net; 
  • Livros: Shipping Company Losses of the second World War, Ian M. Malcolm; Lista dos Navios da Marinha Portuguesa, datas 1939 a 1945;