Outro Airacobra (AP292) aterra em Lisboa

Data

Local

Força

Avião

 

Origem-Destino

 

Tripulação

27-04-1943

Aeroporto da Portela - Lisboa 

USAAF     Ferry Command

Bell P-400 Airacobra       AP292

 

Portreath (GB) → Port Lyautey (Marrocos)

 

2Lt   Richard L. "Dixie" Alexander   USA

fotografia do navio Alpha

Richard "Dixie" Alexander como piloto da RAF

Richard “Dixie” Alexander partiu de Inglaterra no seu caça Airacobra, atrás de um B-17 que assegurava a navegação até ao Norte de África, mas ao largo da costa portuguesa teve de abandonar o grupo devido a questões mecânicas.

Com problemas na hélice e no sistema elétrico dirigiu-se para terra, entrando em Portugal pela zona do Porto, antes de seguir para sul até encontrar o Aeroporto de Lisboa onde aterrou no dia 27 de abril de 1943.

Numa autobiografia que publicou em 1988 – “They called me Dixie” -  Richard Alexander conta as aventuras durante o período da guerra e um dos capítulos é dedicado à sua passagem por Portugal. Trata-se de um livro de leitura fácil, mas onde nem sempre os relatos parecem coincidir com o que referem outras fontes. Neste texto, e sempre que surgirem dados não coincidentes, chamaremos a atenção para as diferenças.

Quando saiu do cockpit foi rodeado por militares portugueses comandados por um oficial que falava inglês. Diz depois que num dos edifícios do terminal lhe foram servidas sandes e cervejas. Uma hora depois chegou um membro da Legação Americana em Lisboa acompanhado de dois outros pilotos que, segundo Richard, eram um americano e outro inglês.

Os registos do Aeroporto de Lisboa e outras fontes, no entanto, asseguram que se tratavam de Frank Atkins e William Raymond Allen – ambos americanos - que também chegaram em Airacobras. Alexander dá também a entender que fez uma aterragem forma solitária, mas ele e Atkins fizeram-se à pista às 11:06 horas, enquanto Allen fez o mesmo um minuto depois. Não há razões para que não se tivessem visto antes ou soubessem uns dos outros.

Entregues às autoridades portuguesas seguiram para Elvas a 28 de abril. Como outros pilotos Aliados ficaram internados no Hotel Internacional onde diz que encontrou “boa comida, uma mesa de snooker e percevejos”.

Os dias foram passados a beber, jogar, passear pela cidade e pelas imediações, fazer compras e construir modelos de aviões. Fez amizade com vários oficiais do regimento de cavalaria local e também com diversos civis. Entre eles um tal de Jon Barabas (possivelmente seria João Barbas, um nome que surge pontualmente referido noutros locais), que o convidou para o clube de tiro onde fez pela primeira vez tiro aos pratos. Devido à qualidade das suas prestações foi convidado a participar num torneio internacional de tiro aos pombos, que se realizou em Elvas, com mais de 200 participantes. Conseguiu classificar-se entre os 11 primeiros.

A certa altura fez uma contusão na virilha. Apesar de tratado por um médico de Elvas não conseguiu melhorar e acabou por ter de procurar ajuda de um especialista em Lisboa.

Fontes:
* “Aviões da Cruz de Cristo” – Mário Canongia Lopes
* "Spitfires e Hurricanes em  Portugal - Mário Canongia Lopes.
* ARQUIVO ANA -Aeroportos de Portugal
*Book: "They called me Dixie" - Captain Richard L. Alexander
* Missing Aircraft Report - AFHRA, footnote.com




fotografia do navio Alpha

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Charles Botvidson e Richard Alexander (mais à direita) convivem num café em Elvas
(Imagem: They called me Dixie - Richard Alexander)

Alexander explica de forma rocambolesca que ele e outros dois aviadores encetaram uma fuga para Lisboa. Os outros estariam cansados de esperar pelo repatriamento e queriam pedir explicações na Legação enquanto ele precisava ser tratado de forma conveniente. Teriam embarcado num autocarro a gasogénio onde Alexander partilhou o banco com um ganso, que insistia em saltar-lhe para o colo.

O gasogénio foi muito utilizado na Segunda Guerra pelo facto da gasolina ser escassa e cara. Trata-se um sistema de queima de combustível sólido – madeira ou carvão, por exemplo – que produz gases que alimentam um motor a combustão. Os veículos transportam um tipo de fornalha nas traseiras onde realizam a queima das matérias combustíveis. São necessárias paragens constantes para abastecer o sistema.

Foi durante uma dessas paragens que Alexander terá sido abordado por um português, que conhecera durante o torneio de tiro. Foi á boleia no automóvel desse conhecido que os americanos aproveitaram entraram em Lisboa.

Aqui encontramos mais diferenças entre as versões de Alexander e outras fontes.

Parte do processo burocrático existe no Arquivo Militar e contraria a existência de uma suposta fuga. Alexander foi autorizado a deslocar-se Lisboa para “consultar um especialista” a 11 de junho de 1943 e viajou dois dias depois. Não existe ainda nenhuma menção a que a viagem tivesse sido feita na companhia de outros pilotos, como acontece noutros processos semelhantes.

A 3 de Julho o americano ainda está na capital portuguesa, já na companhia dos conterrâneos Savoy e Botvidson – ambos tenentes e pilotos que tinham também chegado em Airacobras. Todos recebiam tratamento médico especializado. Não foi possível apurar as datas em que os últimos fizeram a deslocação de Elvas para Lisboa.

Alexander alega que durante uma das saídas ficou amigo de uns pilotos alemães, também internados. Numa das conversas eles disseram-lhe sabiam da sua partida e que os navios em que iriam seguir para Gibraltar seriam atacados e afundados.

A informação terá sido passada a outros aviadores reunidos pela Legação americana em Lisboa para serem repatriados. Após um debate terão decidido que cada um escolheria o que fazer. Dos nove militares apenas dois seguiram viagem, enquanto os outros foram presos.

Esta é a versão de Dixie Alexander.

Não há registo de aviadores alemães internados neste período, mas os homens que encontrou – mais de que uma vez – podem ser indivíduos ligados a outros serviços alemães.

Há, no entanto, outras fontes que não corroboram este testemunho. Jack Gompf, outro dos pilotos envolvidos, não faz qualquer referência a aviadores alemães nas notas pessoais que deixou. Nelas explica que quando embarcaram, a 7 de Julho de 1943, se aperceberam de que os tripulantes do navio estavam bêbados e que nos porões se encontravam dezenas de marinheiros, náufragos embarcados em Lisboa, também alcoolizados. A presença de tantos passageiros agravava as já débeis condições de salubridade existentes. Esta ausência de condições levou a que os homens se tenham recusado de embarcar apesar da insistência do comandante do navio e das autoridades americanas.

O forte de Caxias terá recebido estes pilotos rebeldes. Ali segundo – segundo as memórias - contactaram com presos políticos do regime português.

A 25 de julho seguiram de avião para Argel, onde tinham à espera um tribunal marcial. O julgamento teve lugar a 27. Richard Alexander, apontado como o líder da sublevação, arriscava o afastamento da USAAF, a prisão e pagamento de multas. A acusação definia-o como "um homem sem quaisquer princípios ou disciplina militar". Para os restantes pediam-se sentenças pesadas para servirem de exemplo.

Apesar da gravidade das acusações o tribunal marcial - constituído por 12 oficiais e presidido pelo coronel Harold Neel – decidiu-se por penas leves. Uma reprimenda oficial e a obrigação de ficarem confinados, durante três meses, às bases para onde fossem destacados.

Entre as atenuantes esteva a falta de pilotos e a dificuldade de acusar os militares de cobardia, porque seis deles tinham combatido como voluntários na RAF.

Richard "Dixie" Alexander era um desses pilotos, tendo feito parte de um dos Esquadrões Águia em Inglaterra. Tratavam-se de unidades da RAF que reuniam voluntários americanos, muito antes dos EUA entrarem na guerra. O treino destes pilotos foi feito no Canada, para onde Alexander viajara em finais de 1940 para se oferecer como voluntário. No final do ano seguinte já estava no Reino Unido.

Em setembro de 1942, após os EUA entrarem na guerra a maioria destes aviadores foram integrados na USAAF – a força aérea do exército americano. Foi nessa condição que chegou a Portugal.

Regressado ao ativo combateu no Norte de África, na Sicília, na Córsega e na Itália.

A 30 de Maio de 1944 foi abatido enquanto escoltava bombardeiros B-24 sobre a Alemanha. fez uma aterragem de emergência num caça P-51 e durante alguns dias conseguiu fugir à captura. Foi libertado no final do conflito.

O avião em que aterrou em Portugal foi levado para uma base militar a 29 de Abril pelo Alferes Maia. Terá depois integrado esquadrilha OK da Aeronáutica Militar.

Carlos Guerreiro